sexta-feira, 26 de junho de 2020

A MEDITAÇÃO NO SER


Baseado nos Ensinamentos de Ramana Mahārhi


Esta técnica é a que melhor exemplifica o Jñāna Yoga, o Yoga do conhecimento da realidade. Ātma Vichāra é o questionamento sobre a natureza real da alma. Esta técnica tem como objetivo eliminar as falsas ideias sobre o Eu e o ego, e nos ensinar a separar o espectador do espetáculo, a consciência que percebe e o que é percebido.

Procure sentar-se de pernas cruzadas, sobre almofadas ou em algum assento que o deixe confortável. Repare que seus joelhos dobrados devem estar abaixo de seu quadril. Perceba o contato de suas pernas com o chão. Agora, organize seu quadril, o contato das nádegas com o chão. Sinta todo o amparo oferecido pelo chão ao seu corpo.

Tenha consciência de sua coluna vertebral, alinhando-a desde o quadril até a base da cabeça. Sua coluna deve estar ereta e equilibrada – sem pender para frente, nem para trás, nem para um lado e nem para o outro. Observe a cinta abdominal, recolhendo com muita suavidade os músculos abdominais, para que tenha maior conforto lombar. Mantenha seu peito aberto, colocando seus ombros bem para o lado. Com os braços relaxados, entrelace os dedos das mãos e deixe-as apoiadas sobre a base de seu corpo em suas pernas.

Agora, dirija a atenção para a cabeça. Ela deve estar no prolongamento da coluna vertebral, no alinhamento e ligeiramente inclinada para frente, enquanto a nuca é levada para trás. Com os músculos da mastigação descontraídos, relaxe a boca e mantenha a língua em contato com o palato, logo atrás dos dentes. Relaxe as pálpebras e os olhos, que devem estar com seu foco no ponto entre as sobrancelhas, o espaço dentro da testa chamado de tela mental.

Observe, então, sua respiração. Ela deve estar leve, solta e tranquila. Com a atenção no triângulo formado pelas narinas, mantenha-se como testemunha de seu ato de respirar. Perceba o ar que entra e que sai pelas narinas. Nada mais além disso!

Tome consciência de seu verdadeiro “Eu” – aquele que está além de tudo e que a tudo testemunha, imutável, eterno, sereno, uno, pleno e absoluto. Questione-se: quem sou eu? Ao final, mergulhe em profundo silêncio!

Quem sou eu, que não é este corpo? Eu posso ver e tocar este corpo, que é transitório e se modifica a todo momento. Ele me serve como instrumento do plano físico, mas eu não sou este corpo. Se eu o percebo, então ele está fora do “eu”, do qual eu sou.  Eu sou o ser, que é imaterial, imutável e imperecível.

Quem sou eu, que não é esta mente que pensa? Essa mente se agita e se modifica a cada instante. A cada nova percepção, uma nova ondulação na mente provoca um novo pensamento. Se percebo isto, então esta mente que pensa é apenas uma projeção que, em dado momento acaba ou se modifica. Eu sou o ser, que é pleno de serenidade e paz.

Quem sou eu, que não sou os cinco sentidos? Os cinco sentidos registram tudo aquilo que está fora de mim. Eles são apenas um instrumento utilizado pela mente para perceber e interagir com o mundo externo. Eu percebo o que os sentidos registram e esses registros, além de se modificarem a cada instante, eles separam, geram confusão e limitam todas as impressões. Isto não expressa a realidade. O ser é plenamente integrado e sem ruídos. Eu sou o ser, que é silêncio e comunhão.

Quem sou eu, que não sou as emoções? Eu identifico as emoções e percebo que elas variam a todo momento – ora são de prazer, ora são de lamento e dor. As emoções não são estáveis e contínuas. Se eu as percebo, é porque estão fora de mim e nada que esteja destacado de mim mesmo pode ser o verdadeiro eu. As emoções pertencem aos mecanismos do ego, que é passional e inconstante. Eu sou o ser, que é ponderação e equilíbrio.

Quem sou eu, que não sou sensações? As sensações pertencem a este corpo físico para fazer o intercâmbio, através dos sentidos, com o meio externo. Elas flutuam, conforme os estímulos que recebe e as inferências criadas pelo ego. Elas se manifestam dentro de um vasto campo que vai do desconfortável ao agradável, e não pertencem à neutralidade do ser absoluto. Eu sou o ser, que é neutro e pleno de satisfação.

Quem sou eu, que não sou desejo, necessidade, vontade? O desejo e a vontade nascem da necessidade do ego, que é incompleto e carente, por não reconhecer a totalidade que já é. O verdadeiro ser nada deseja, nada necessita, nem aspira, porque é o todo e fora do todo nada existe. Se existe algo fora do todo, então o todo não é tudo, e isto é impossível ao que é absoluto. Eu sou o ser, que é plenitude e infinitude.

Quem sou eu, que não sou passado, presente e nem futuro? O passado faz parte da memória e o futuro, da imaginação. Ambos, memória e imaginação, são estruturas usadas pelo ego. O presente é apenas um divisor entre o passado e o futuro. Nesse exato instante, o presente já se tornou o passado, dando lugar ao que era futuro. Isso é a efemeridade daquilo que percebo como vida, e representa a ilusão causada pelo ego. Eu sou o ser, que é atemporal e eterno.

Quem sou eu, que não sou ego, personalidade? O ego é apenas uma pequena parte de minha existência. Ele é o personagem que represento em cada existência. A cada nova existência, entra em cena um novo personagem. Desta forma, o ego se fragmenta em inúmeras representações. O verdadeiro “eu” é aquele que está no ápice e que testemunha a todas as representações. O verdadeiro “eu” abarca e integra todos as personalidades. Eu sou o ser, que é tudo.

Quem sou eu, que não sou os papéis que represento? Tenho inúmeros papéis a representar nesta vida – ora estou como pai ou mãe, ora como filho ou filha, ora como patrão, ora como empregado, ora aluno, ora professor. A cada momento assumo um papel diferente. Percebendo estes variados papéis, concluo que alguém está por trás, dando vida a cada personagem. Este alguém é o ser essencial. Eu sou este ser essencial, que é a verdadeira natureza, a verdadeira identidade.

Quem sou eu, que não sou individualidade? A individualidade me dá uma noção de separatividade – eu estou aqui e aquilo ou o outro ali – como compartimentos. Isto me cria uma limitação, quanto à interação com o todo, que não se afina com aquilo que é eterno, infinito e pleno. Algo unifica a tudo, fazendo com que tudo se inter-relacione. Quando percebo isto o “eu” indivíduo se esquece na unidade do verdadeiro “eu”. Eu sou o ser, que é a unidade.

Quem sou eu, que não sou orgulho e vaidade? Orgulho e vaidade estão fundamentados no conceito de separatividade criados pelo ego. Uma flor expressa sua beleza e seu aroma para todos, porque esta é sua natureza, e para ela é simples assim manifestar sua perfumada beleza. Não há orgulho, nem vaidade, nas manifestações da natureza, porque não há a complexidade do ego, e este não é o verdadeiro ser. Eu sou este ser, que é simplicidade.

Quem sou eu, que não sou insegurança e medo? Insegurança e medo são aspectos da escuridão ou ignorância do ego, que é confuso e identificado com a dualidade e a impermanência da coisas e fatos pertencentes aos planos existenciais. O verdadeiro ser tem total clareza de tudo. Impassível, o ser essencial não se altera, pois tudo conhece, tudo alcança e tudo gesta. Eu sou este ser, que é luz.

“Não há como se tornar real, aquilo que é irreal; nem há como desaparecer aquilo que é a realidade essencial. Mas, a verdade de ambos é vista pelos que veem a realidade. Portanto, tome conhecimento do indestrutível que permeia tudo isto; pois, ninguém pode destruir aquilo que é imutável. Os corpos que são instrumentos do Eu, que é eterno, indestrutível e incomensurável, são declarados como sujeitos ao desaparecimento. Portanto, lute para se libertar das percepções errôneas”.
(Bhagavad Gītā II – 16, 17, 18)

“O Eu nunca nasceu e jamais morrerá; se sua existência nunca teve um início, tampouco terá um fim. Este Eu que é não-nascido, é eterno, imutável, primordial. Ele não morre, quando o corpo se acaba”.
(Bhagavad Gītā II – 20)

“Armas não cortam este Eu, tampouco o fogo não o queima. A água não o molha, nem o vento o seca. Ele, o Eu, não pode ser cortado queimado, molhado nem seco. Ele é eterno, em tudo penetrante, firme, imóvel, antigo, mas sempre o mesmo”.
(Bhagavad Gītā II – 23, 24)

Agora, mergulhe no silêncio e se conscientize da beleza, da simplicidade e da unidade que é. Desfrute da infinitude, da eternidade e da plenitude do Ser.




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